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08/03/2017 às 09h26min - Atualizada em 08/03/2017 às 09h26min

Dia Internacional da Mulher: as conquistas e os obstáculos, após décadas de luta

Vereadora, delegada, socióloga, cientista e executivas relatam experiências, dramas e vitórias

O Fato com JB
Agências de Notícias

Décadas de luta não foram suficientes para mudar a lista de reivindicações. Fim da violência doméstica, aborto legal, seguro e gratuito, igualdade salarial, fim da dupla jornada de trabalho, entre outras tantas bandeiras compõem o grito feminista neste dia 8 de março. Mulheres de diferentes áreas do saber falaram com o Jornal do Brasil sobre avanços, retrocessos e dificuldades em trajetórias de vida.

“Houve uma série de avanços desde a redemocratização do país, e são avanços legais. Porém eles não foram suficientes porque não penetraram profundamente na sociedade e na consciência das pessoas”, avalia a professora de Sociologia da UFRJ Bila Sorj.

Em março de 2015 foi sancionada a Lei do Feminicídio, classificando com crime hediondo e com agravantes de violência doméstica e familiar. Em 2014, foi sancionada a guarda compartilhada entre pai e mãe. E anteriormente, em 9 de agosto de 2006, surgiu a  Lei Maria da Penha, que pune a agressão contra o sexo feminino. 

“Temos, hoje, um ressurgimento do feminismo com uma penetração nas periferias e nas classes baixas. Essas camadas estavam muito distantes desse debate”, acrescentou Bila, para quem as redes sociais têm sido ferramenta essencial na dissipação desses ideais menos teóricos e mais testemunhais.

A igualdade no mercado de trabalho sempre foi uma reivindicação do movimento, e ela é mais uma vez o mote para a greve geral que está sendo convocada por mobilizações internacionais. Mais de 30 países aderiram à causa que pede para que as mulheres parem suas atividades laborais neste Dia Internacional da Mulher, em um protesto contra a dupla jornada de trabalho.

>> Greve geral marca Dia das Mulheres, numa ofensiva mundial contra onda de conservadorismo

“Há uma relação forte entre os empregos precários e o trabalho doméstico. Quanto mais as mulheres progredirem, mais elas terão que dividir o trabalho doméstico com seus companheiros, ou terão que pressionar para que haja creches em períodos integrais”, ressaltou a socióloga.

Políticas Públicas

Diante disso, a vereadora do Rio e presidente da Comissão de Defesa da Mulher, Marielle Franco (PSOL), destaca a importância de haver mais políticas públicas que assegurem os direitos das mulheres. Entre eles, o de ir e vir.

“O transporte público é o espaço onde a mulher é mais assediada. Passar por um lugar iluminado no Centro e na Zona Sul é diferente do que passar por um lugar não iluminado no subúrbio. E essa circulação da mulher na cidade já é uma resistência”, disse.

Marielle fala sobre uma trajetória de vida como sobrevivência e a conquista de um espaço de voz no campo da legislação. Negra e nascida na favela da Maré, a vereadora foi a quinta mais votada nas últimas eleições do Rio.

“Acho que a mulher deve atuar também no campo de decisão, de legislar para outras mulheres. Nós avançamos no debate feminista, mas há lugar que apresenta o retrocesso como uma resposta a esses avanços. Quando chego, enquanto mulher negra, na Câmara Municipal, não vou me masculinizar e vestir a roupa que a maioria veste. E se isso incomoda na Câmara, imagina no dia a dia. A intenção é trazer para dentro dessa Casa o que as mulheres já vivem fora dela”, completou.

Violência

Os números da violência, porém, continuam alarmantes. Dados do Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ) registram 118 casos de lesão corporal por dia contra mulheres. No carnaval deste ano, a Polícia Militar do Estado do Rio divulgou que a cada quatro minutos uma mulher foi agredida durante o período. Segundo a ONG Action Aid, a violência doméstica mata cinco mulheres por hora no mundo, e a pesquisa ainda aponta que até 2030, 500 mil mulheres serão vítimas de feminicídio por seus parceiros e familiares. O Brasil está em quinto lugar no ranking de homicídio contra mulheres. E segundo o “Mapa da Violência” de 2015, o maior Rondônia lidera o índice de mulheres brancas e o Espírito Santo ficou em primeiro no homicídio de mulheres negras.

“A Delegacia de Atendimento à Mulher quer que a vítima tenha consciência de que ela não é culpada pela violência, seja ela física, moral, ou emocional. Nós temos feito campanhas justamente para dar visibilidade a isso. Desde a Lei Maria da Penha, a mulher tem procurado mais ajuda para interromper essa violência. Mas ainda há uma questão cultural enraizada que estamos lutando para acabar”, disse a diretora da Divisão de Policia de Atendimento a Mulher do estado do Rio (DEAM-RJ), Marcia Noeli Barreto.

Ela conta que ainda existem falhas no atendimento. Circula no Congresso um projeto de lei pedindo que as medidas protetivas – hoje, podendo ser deferidas sem tempo determinado apenas por um juiz – possam ser imediatamente aplicadas em casos que a vítima corre risco a partir do momento que fez a denúncia. Além disso, ela explica que nesta terça-feira (7) saiu um boletim interno exigindo um grupo de estudo para modificar o curso de novos policiais, com uma cadeira específica de atendimento à mulher. Hoje, o Rio conta com 14 delegacias especializadas e 19 núcleos de atendimento à mulher – espaço reservado dentro de uma delegacia comum com policiais mulheres atendendo às vítimas.

“Quanto mais capacitamos um policial, quanto mais ela esta empenhada a atender, mais vamos conseguir interromper a violência”, disse.

A delegada entrou para a polícia em 1986, em uma época que, ela conta, a dificuldade era muito maior. “Só tinha uma delegada que virou titular da primeira delegacia de mulheres. Nós fomos todas enfrentando obstáculos. Os homens da polícia mandavam a gente voltar para casa para lavar um tanque. É uma satisfação ver que hoje abrimos o caminho para que meninas mais novas queiram se tornar policiais. Que haja mais chefes de policia, mais mulheres na diretoria”, reivindicou Márcia.

Chefia

Um exemplo em cargo de direção e chefia é o da bióloga molecular e geneticista Mayana Zatz. Ela é professora da Universidade de São Paulo (USP), pioneira em pesquisa no campo de doenças neuromusculares e diretora do laboratório no Centro de Estudos do Genoma Humano da USP. Mayana conta que fez mestrado e doutorado grávida, exercendo dupla jornada de trabalho como estudante, mãe e doméstica.

“As pessoas questionam por que há muito menos mulheres em cargos de chefia. A minha impressão é a de que, quando chegam nos 30 e tantos anos, as mulheres resolvem ter filhos. E aí elas não conseguem se dedicar muito ao trabalho. Ela tem que escolher entre ter filhos e competir com o homem para ser bem-sucedida profissionalmente. Eu tinha que me dividir para atender as funções de mãe, estudante e doméstica, e era difícil. Não tinha divisão igual para o homem”, contou.  

Apesar disso, Mayana afirma que a maior experiência em discriminação por ser mulher, ela passou nos Estados Unidos. “Lá, o salário, por exemplo, é menor para exercer a mesma função, e não tem licença maternidade”, disse.

Priscyla Naham faz coro a Mayana. Ela ocupa a vice-presidência de vendas ao consumidor da Microsoft Brasil. Priscyla é graduada em marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), tem MBA pelo Insper e, em 2013, concluiu o Programa Executivo da Universidade Stanford, nos EUA.

“Quando fui fazer o curso em Standford, meu marido foi me levar. Todo mundo no campus cumprimentava a ele e não a mim. Eu basicamente era a mulher de férias e parecia que era ele quem ia fazer o curso”, relatou.

Ela destaca a importância de haver uma luta pela igualdade feminina, mas sem deixar de pensar no alcance dos homens, para que estes também evoluam. “Boa parte do sucesso da minha carreira teve o suporte do meu marido. Nós temos que seguir com os nossos desejos, mas há um papel importante de ele te dar suporte e não embarreirar. E quando tivermos embarreiramento, temos que reagir”, disse.

A presença da mulher no mercado de trabalho, assumindo cargos de liderança e com salários iguais aos dos homens, é um dos principais temas desse Dia Internacional da Mulher. A linha evolutiva de mulheres ocupando cargos de liderança no Brasil não sai da casa de 8%. O desafio é uma prioridade para Tania Cosentino, presidente da Schneider Electric para a América do Sul, especialista global em gestão de energia e automação.

“Estima-se que levaremos 100 anos para alcançarmos a equidade de gênero nas lideranças das empresas. Não podemos esperar. É preciso trabalhar interna e externamente, na conscientização de empresas e executivos e no diálogo com jovens para atrair mais mulheres para o mercado, mostrando efetivamente que todas podem chegar lá e a transformação social e econômica que essa transformação vai gerar”, alerta Tania. “Estudos confirmam que a equidade de gêneros traz melhores resultados financeiros para as organizações e que a diversidade gera mais inovação”, explica a executiva.

* do projeto de estágio do JB


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